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Imprecisão é acerto de 'Antologia da Cidade Fantasma'

Por SÉRGIO ALPENDRE/ FOLHAPRESS | Edição do dia 14/02/2020

Matéria atualizada em 14/02/2020 às 04h00

Horror estreia na próxima quinta-feira (23) e deve surpreender
Horror estreia na próxima quinta-feira (23) e deve surpreender - Foto: Divulgação
 

Certos gêneros ainda sofrem um tipo de preconceito estranho. Acontece frequentemente com o melodrama, citado sempre de modo pejorativo. Com o horror é um pouco diferente, mas injusto da mesma forma. Em texto para a revista inglesa “Sight and Sound”, o crítico Geoff Andrew (ou seu editor, já que está no destaque) escreveu que em “Antologia da Cidade Fantasma”, o diretor, Denis Côté, “resiste à tentação de fazer um filme de horror para oferecer um instigante estudo sobre como lidamos quando pessoas próximas se vão”. É o caso de pensarmos: por que não pode ser os dois, um filme de horror que também é um instigante estudo sobre o que quer que seja? Ou o horror precisa ter sangue, muitos sustos e não pode ser sério? Muitos historiadores entendem que, com “Psicose” (1960), Hitchcock tirou o horror da masmorra dos gêneros subestimados e o colocou numa redoma de seriedade nunca antes vista, confirmada pouco depois com “Os Pássaros” (1963). Não à toa, o cinema americano viveu uma grande fase do cinema de horror após isso, com filmes sublimes como “O Bebê de Rosemary” (Roman Polanski, 1968) e “O Exorcista” (William Friedkin, 1973), entre outros. Contudo, 60 anos depois, ainda é possível perceber que boa parte da crítica e do público mais, digamos, culto, reage negativamente a um filme de horror. Há quase uma regra implícita: se é horror, não pode ser realmente bom. Pois se há problemas no filme de Denis Côté, certamente não está no gênero escolhido, nem mesmo na tentativa de disfarçar esse gênero (não é só a crítica que tem preconceitos, afinal). O que importa é que mesmo contra sua vontade, “Antologia da Cidade Fantasma” é um drama de horror. Um filme em que aparições misteriosas nos deixam com um frio na barriga, reforçado pela paisagem gélida do Québec. Estamos numa vila de apenas 215 habitantes chamada Irenée-les-Neiges. Logo no início, a paisagem branca recebe um carro desgovernado, que bate com tudo em um muro de grandes pedras. Umas crianças mascaradas percebem o carro estraçalhado e passam a brincar em volta dele. Seriam fantasmas? Somos então apresentados a Jimmy Dubé (Robert Naylor), irmão do morto Simon Dubé (ator misteriosamente não creditado). Numa comunidade desse tamanho, uma morte é sempre traumática, ainda mais porque suspeita-se de suicídio. Aos poucos, a ideia trazida pelo título é reforçada. Estamos mesmo em uma história de fantasmas. Logo descobre-se que os antigos habitantes da cidade reivindicam espaço no lugar onde habitavam quando vivos. Não saberemos muito mais que isso, e podemos dizer que essa imprecisão é um dos acertos do filme de Côté. Não se explica, por exemplo, por que uma personagem começa a levitar em determinado momento. Ou por que a morte de Simon desperta esses fantasmas. O jogo entre o mostrar e o esconder é bem realizado pelo diretor, deixando-nos por vezes em suspense, por outras, ansiosos pelo corte revelador. O horror do filme está também nessa expectativa nem sempre atendida.

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