A recessão e o desemprego são duras realidades do coronavírus, que mata, contamina, estrangula o sistema de saúde e a economia de Alagoas. Porém, não há colapso financeiro. O isolamento social provoca recessão e ao mesmo tempo atrai recursos federais que geram receita bruta de R$ 1,7 bilhão destinados a 1,1 milhão de alagoanos, a metade atendida pelos programas sociais. Esse valor deve aumentar nos próximos dias para mais de R$ 2,59 bilhões, com o repasse do dinheiro reservado para o estado pelo Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, sancionado na última quinta-feira pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Em recursos diretos, Alagoas receberá pouco mais de R$ 891 milhões, distribuídos para o Poder Executivo Estadual e os 102 municípios alagoanos. O governo de Alagoas receberá R$ 564 milhões, sendo R$ 152 milhões para aplicação obrigatória na saúde pública e R$ 412 milhões de livre aplicação. Para os municípios alagoanos, o total do auxílio emergencial, segundo o Senado, é de cerca de R$ 328 milhões, sendo R$ 48 milhões para a saúde pública e R$ 279 milhões de livre aplicação.
Os recursos já enviados e os que estão por vir servem para movimentar o consumo dos pequenos negócios, supermercados, feiras livres e de prestadores de serviços. Esta é uma das conclusões da recente pesquisa do professor doutor em economia da Universidade Federal de Alagoas, Cícero Péricles. A situação atípica poderá ser modificada a partir de julho ou agosto, quando a fase mais aguda da epidemia passar, acreditam também analistas e os segmentos da indústria e do comércio. O Estado, segundo Cícero Péricles, possui 1,1 milhão de famílias - distribuídas entre os 3,3 milhões de habitantes, segundo estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ( IBGE). Desde abril, 550 mil pessoas tiveram acesso ao Auxílio Emergencial, que paga, em média, R$1,1 mil aos inscritos no programa Bolsa família. A receita mensal do setor passa de R$ 440 milhões. A previdência social pagou aos 530 mil beneficiários e antecipou a 13ª parcela, dividindo-a entre maio e julho. No mês de março, os recursos somaram R$ 660 milhões. Os 140 mil funcionários públicos - principalmente o seu maior conjunto, o municipal _ está recebendo em dia, significando mais R$ 300 milhões/mês em circulação. Some-se a isto a renda dos 300 mil trabalhadores com carteira assinada que continuam empregados e receberam aproximadamente R$ 420 milhões em abril. Ao analisar os programas, Cícero Péricles constatou a renda bruta de R$ 1,7 bilhão. 90% desse montante se destina ao consumo. Esta renda, conforme o pesquisador, está movimentando as feiras e o comércio, que adotaram estratégias parciais de funcionamento. Este movimento chega às indústrias, principalmente as vinculadas ao consumo popular, como alimentos, material de limpeza, de higiene e remédios.
Ele avalia que o problema será mais à frente, no pós-pandemia, quando esses mecanismos de socorro social forem suspensos. “A receita cairá radicalmente”.
MOVIMENTO
Os consumidores sabem que a maioria dos estabelecimentos comerciais não parou. Em Maceió o atendimento acontece nas formas pegue- e leve, por encomenda, delivery e atendimento com hora marcada. Os estabelecimentos dos serviços essenciais funcionam normalmente, confirma a designer e jornalista Maria Esther Carnaúba, que se adaptou ao novo modelo de consumo. No interior, as prefeituras adotaram estratégias de segurança da saúde para garantir o funcionamento de feiras e estabelecimentos, confirma a presidente da Associação dos Municípios de Alagoas, a prefeita de Campo Alegre, Pauline Pereira (PP). Ela, no entanto, revela que a pandemia “derrubou” a arrecadação tributária dos 102 municípios e acelerou o empobrecimento.
ISOLAMENTO
As autoridades da saúde e setores econômicos do executivo estadual preveem a manutenção do isolamento social. Mesmo assim, economistas como Cícero Péricles percebem a economia funciona desde março, com as dificuldades e limites próprios do período da pandemia e das medidas de isolamento social. Observa que cada setor reage de forma diferenciada. A agricultura, por suas características, tem o afastamento natural da população em relação aos aglomerados urbanos, tornando quase desnecessário o isolamento. A comercialização agrícola é feita distante do espaço de produção, na medida em que os produtos vão para as cidades. No outro lado da economia, Péricles vê o setor de comércio e serviços atingidos porque necessitam do atendimento presencial e do consumo no próprio local. Os setores essenciais, como a rede hospitalar, postos de gasolina, farmácias, sistema financeiro, supermercados e rede de abastecimento alimentar, tiveram suas atividades mantidas. Os segmentos não essenciais, como os vinculadas ao turismo – hotéis, pousadas e restaurantes; o comércio de varejo, do pequeno negócio aos shoppings, perdeu faturamento e, mesmo flexibilizados, não terá desempenho normal a curto ou médio prazo, devido ao afastamento de consumidores.
TAXA NEGATIVA
Pelas dificuldades setoriais na própria economia estadual e pelos vínculos cada vez mais estreitos de Alagoas com a economia brasileira e nordestina, Cícero Péricles destaca que haverá uma taxa negativa entre 4% a 10% refletindo o desempenho nacional. “É uma situação lamentável porque a economia estadual vinha se recuperando desde 2017”. Isto significa, segundo o pesquisador, mais empresas fechadas ou em recuperação judicial, mais desemprego no mercado de trabalho já limitado, mais inadimplência e menor arrecadação de impostos tanto das prefeituras como do Estado. “No sentido mais amplo, mais pobreza e mais desigualdade”.