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OLHANDO PARA TRÁS, OLHANDO PARA FRENTE

Alagoanos e alagoanas refletem sobre as dificuldades e os aprendizados de 2020

Por MAYLSON HONORATO | Edição do dia 26/12/2020

Matéria atualizada em 26/12/2020 às 04h00

Fazer retrospectivas é um costume, uma tradição que nos põe em um lugar de observação para o que foi feito, o que passou, mas também de perspectiva - vislumbrando o que vem adiante. É com esse pensamento que alagoanos e alagoanas revisitaram os meses de um difícil 2020, um ano que pôs à prova relações, limites, status, que provocou todo tipo de sentimento e reflexões acerca da existência e da organização social.

A pandemia de 2020, o distanciamento, as perdas, não podem ser romantizados, mas também algum aprendizado pode - sim - sobrar de tanta dor, sem que isso seja de alguma forma algo para se comemorar, mas para se pontuar.

Izabelly Sena, alagoana que trabalha como produtora cultural, define 2020 como um ano “atípico, cercado por incertezas, sem trabalho, sem esperança de quando tudo voltará ao normal, mas também de muita aproximação com a família”. Para ela, que viu os eventos sumirem da agenda, o ano foi de um desafio pessoal e profissional sem precedentes e que demandou persistência, fé e organização.

“Um ano reflexivo e de muito aprendizado! Desaceleramos para o bem da humanidade e precisamos considerar alguns pontos. Por exemplo, acredito realmente que aprendi o verdadeiro significado de empatia neste ano, na dor”, revela a produtora.

“Que ano, hein? Que ano! O pensamento voa com esse ano, que passou tão rápido e ao mesmo tempo tão devagar. Precisávamos de pressa e não tínhamos resposta para esse caos instalado no planeta. Uma desorganização mundial e ao mesmo tempo uma organização familiar e dentro de cada ser humano uma esperança por dias melhores. Me pergunto, será que, depois de tudo isso, tudo vai voltar ao normal? Será que voltaremos a trabalhar? Será que voltaremos a espalhar amor e alegria para as famílias?”, diz Izabelly, ao se referir ao seu trabalho. “Vivemos de eventos e estamos passando por um ano aterrorizante. Um medo toma conta da minha mente por conta desse vírus e se conseguirei passar por esse momento tão incerto.”

O setor cultural e de eventos foi um dos que mais foram afetados com a pandemia do novo coronavírus e ficou praticamente 100% parado. Izabelly Sena explica que, como consequência, além de músicos, produtores e profissionais que trabalham diretamente com shows e espetáculos, garçons, cozinheiros, recepcionistas, motoristas e diversos outros trabalhadores perderam o emprego. Ao olhar para trás, ela diz que só pensa no futuro e na vacina.

“Que 2021 venha com a vacina para a cura dessa doença terrível. E que fiquem a empatia, o respeito ao próximo, o amor, a felicidade, a vontade de lutar por dias melhores, a fé que não pode nunca nos faltar, a gratidão e que possamos acreditar que será um ano de realizações para a vida de cada um. Vamos vencer tudo isso com muita gratidão dentro do peito!”

FORMANDOS DA PANDEMIA

Para o estudante Thiago Calado, 2020 tinha um significado especial, já que era o aguardado ano da formatura em Odontologia. Ele conta que o ano se transformou em um grande desafio para ele e para sua turma. Eles tiveram que lidar com o medo da contaminação, a continuidade dos atendimentos na clínica da faculdade e, ainda, o Trabalho de Conclusão de Curso.

“2020 termina com uma sensação estranha, como se não pudéssemos sequer comemorar as coisas que conquistamos neste ano tão difícil. Acredito que, para quem escolheu seguir a área da saúde, este ano é uma grande lição sobre a missão de quem está ali para servir as pessoas. Seja um dentista, um médico, um enfermeiro, um psicólogo, todos estaremos de pé, mesmo quando exaustos com tantas coisas acontecendo”, diz.

“Acredito que precisamos olhar para frente pensando que o pior já passou, que os próximos meses serão de reconquistar a normalidade possível. Pessoalmente, acredito que devemos nos organizar mentalmente, espiritualmente para o que vier, além de ficarmos juntos das pessoas que amamos. Já profissionalmente, acredito que devemos aprimorar ainda mais as medidas de segurança dentro dos consultórios, mas também torná-los locais ainda mais acolhedores, pois os pacientes também chegam com medo”, continua.

“Em relação a formatura, ficou para 2021, assim como tantas possibilidades de dias melhores. Mas o importante é que ficou para o próximo ano somente o ato de formatura, conseguimos concluir os estudos e o TCC este ano. Não foi fácil. Por isso até parabenizo aos meus colegas e professores, pois o ano foi desafiador para todos”, completa Thiago Calado.

A jornalista Sidinéia Tavares evidencia que 2020 foi o ano de se reencontrar como parte de uma família. Ao olhar para trás, ela lembra que também foi um ano de espanto, até mesmo para uma profissional que está relativamente habituada com notícias complexas.

“O maior aprendizado este ano, para mim, foi entender o quanto a presença familiar faz falta em momentos que antes eram vistos como comuns. Abraços e afagos, que antes eram tão corriqueiros, se tornaram raros e arriscados para a saúde”, diz.

“Minha mãe já tem 60 anos, é fumante e grupo de risco para a Covid-19, então todo meu cuidado precisou ser dobrado com o isolamento, nós duas só saímos de casa em momentos necessários. E com máscara, álcool em gel e sem contato físico com terceiros. Fui vista como ‘cri-cri’ por muitos, mas prefiro manter minha mãe e a mim seguras do que arriscar pegar o vírus”, relata a jornalista.

“Sobre 2021, meu desejo mais profundo é a vacina. Nunca desejei e esperei tanto por uma picada no braço. Após a vacina, será meu momento de matar a saudade de todos, dos amigos, dos parentes, até dos inimigos.”


UM OLHAR MAIS AMPLO

Jó Djivan Pratapi, neuropata, mestre em Reiki e meditação, defende que 2020 exige de nós um olhar mais amplo para tudo o que aconteceu e, principalmente, para o futuro. Ele diz que o maior aprendizado de 2020 está relacionado ao valor da vida.

“Precisamos refletir e compreender como cada um de nós agimos na atitude coletiva e como devemos agir daqui para frente. O intuito é entender que eu não existo sem o outro. Precisamos entender a vida como algo de valor único e intransferível”, defende.

“Num aspecto mais meditativo e espiritual, precisamos de uma percepção se que a pandemia nos fez olhar para o mundo e ter certeza de que a economia não deve dar as cartas sobre a vida. A economia está a serviço do valor da vida, não o contrário”, diz o mestre, lembrando que a primeira morte por Covid-19 foi de uma empregada doméstica, contaminada pelos patrões que voltavam do exterior.

“Somos uma grande rede, estamos todos interligados. Pensar nisso me engrandeceu como ser humano este ano. Olhar para o mundo e ver que o valor da vida dispensa quantificações e que a gente precisa perceber que qualquer coisa que a gente faça tem consequências. Então, sejamos mais amorosos em tudo, na atitude consigo mesmo, com o outro, com o meio ambiente. O próprio Cristo, nosso maior símbolo, diz que amar o próximo como a si mesmo é nosso grande legado aqui no planeta, em qualquer ano, em qualquer circunstância”, conclui Jó.

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