Uma frente parlamentar formada por deputados estaduais e federais dos nove estados da região Nordeste vem sendo articulada para instaurar uma “investigação profunda” sobre o pagamento antecipado por respiradores mecânicos durante a pandemia. A aquisição desses equipamentos - que funcionam como ventilador pulmonar para dar suporte respiratório aos pacientes internados com a covid-19 - tem sido alvo de denúncias de irregularidades que vão da Bahia ao Maranhão, e em Alagoas não é diferente. Paira sobre o governo do Estado a acusação de pagar mais de R$ 5 milhões por respiradores que nunca chegam, enquanto o número de mortes pelo novo coronavírus não para de subir no estado. A frente parlamentar em formação mira a atuação do Consórcio Nordeste, o colegiado de governadores da região que articula a compra de equipamentos e demais insumos para ações de combate à Covid-19. “Vários deputados, eu e o deputado Cabo Bebeto estamos fazendo uma frente de investigação do consórcio. Através do levantamento de informações com o governo da Bahia e ainda entrando em contato com vários deputados de todos os nove estados do Nordeste, para instaurar uma investigação profunda sobre toda essa situação”, explica o deputado Davi Maia (DEM), que tem levado o problema para o plenário da Assembleia Legislativa Estadual (ALE).
Ele destaca uma preocupação bem específica: “Não existe um portal da transparência do Consórcio Nordeste, nem site. Até agora nós já descobrimos que um dos funcionários, o secretário executivo, também trabalhou no governo Dilma e Lula, e ainda que o consórcio não tem sede e funciona só dentro do Palácio do Governo”, conta Maia. “Além de um pedido de informações ao Gabinete Civil [de Alagoas]”.
Na sessão da última quarta-feira, o deputado Cabo Bebeto (PSL) questionou os valores empenhados pelo governo de Alagoas para a compra de respiradores, via Consórcio Nordeste, e que nunca chegaram. Segundo ele, a conta não bate. O deputado disse que checou no Portal da Transparência e ficou surpreso que existem dois processos, um para compra de 50 respiradores, no valor de R$ 10 milhões, datado de 11 de maio, e outro, para aquisição de mais 30 respiradores, orçado em R$ 4 milhões, de 7 de maio. Segundo ele, os valores foram empenhados, mas não sabe se efetivamente foram pagos. E continua ao afirmar que o governo de Alagoas teve que pagar, no dia 27 de abril, mais de R$ 5 milhões para que o consórcio pudesse fechar a compra. Só um mês depois, a Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) enviou ofício ao presidente do Consórcio Nordeste, governador da Bahia, Rui Costa (PT), para saber o que estava acontecendo. “Parece que foi tarde a pergunta, porque alguns dias depois foi deflagrada a operação da Polícia Civil contra empresa que vendeu os equipamentos e enganou todos os estados. Além disso, por que o Estado de Alagoas quer recuperar R$ 4 milhões se pelo menos R$ 5 milhões foram pagos? O restante do dinheiro serviu pra quê?”, questiona.
FISCALIZAÇÃO
A Gazeta procurou saber entre os órgãos de controle e fiscalização se algo seria feito para investigar as supostas irregularidades. O Ministério Público de Contas, que é vinculado ao Tribunal de Contas do Estado (TC), afirmou em nota que vai aguardar o contrato passar pelo órgão e somente após a análise dos documentos é que deve se manifestar sobre o assunto.
“O Ministério Público de Contas tomou ciência do ocorrido por meio da imprensa. Ainda não temos as informações oficiais do caso em questão. Em regra, todos os contratos celebrados por entes públicos devem ser remetidos ao Tribunal de Contas do Estado até o último dia do mês seguinte à sua celebração, e, durante o trâmite, esses contratos passam pelo MP de Contas para análise e posterior manifestação. Nesse caso específico, o contrato ainda não passou pelo órgão ministerial e somente após a análise dos documentos é que podemos nos manifestar sobre o assunto, inclusive sobre seus desdobramentos”, disse em nota enviada à reportagem da Gazeta. Já o Ministério Público Federal (MPF) informou que pediu à Controladoria Geral da União (CGU) a instauração de procedimento de acompanhamento. Uma auditoria recente da CGU em compras efetuadas por estados e municípios aponta que o preço médio pago por respirador mecânico foi de R$ 87 mil. O valor pago por unidade variou de R$ 28 mil, o mais barato, para até R$ 367 mil, o mais caro, uma diferença de preço treze vezes maior entre um valor e outro. O levantamento da CGU começou no dia 15 de abril, abrangendo todos os estados, mais o Distrito Federal, incluindo cada uma das capitais e cidades com pelo menos 500 mil habitantes. No total, foram analisadas compras efetuadas por 377 entes federados (estados e municípios).